quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Elegia 2: Aos 80 anos do Adeus de Florbela

Há oitenta anos nos dava adeus.
Tão jovem, tão linda,
tão velhinha e sofrida.
Suas mãos, bênçãos divinas,
nos presenteou com os mais
belos versos de nossa língua.
Seu corpo transgrediu pela letra
e pela sua voz silenciou,
o feminino,assim, Florbela pintou.
Tão jovem e tão velha,
ó Bela Florbela, que dor
a nossa em não lhe conhecer.
Ficamos aqui, mais velhos e vazios
sem sua arte, como flor que nunca
pôde desabrochar em totalidade.
Então, junta suas mãos ao peito
e com braçadas de crisântemos dorme,
sonha com os velhos poetas,
que aqui continuamos a sonhar
com a nossa grande asceta,
nossa Florbela poeta,
Aqui ficamos a sonhar com ti.

grande poet

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

ELEGIA - "Do sonho que Bela não acordou" (interlocução com poema do espólio de F.Pessoa)

Dorme, dorme, linda princesa
Enclausurada em seu castelo de areia
tens a paz da pantera a caçar pela noite.
Enjaulada no mundo de versos
passeia pela noite afora
em busca de amor na floresta.
Dorme, dorme, irriquita pantera,
que mal pode fazer-lhe
os sons da Charneca e o frio
da noite de luar?
Dorme, dorme, minha poeta
para que de manhã
a sua alma sofrida
a dor não venha mais procurar.

A Florbela Espanca por Michelle Vasconcelos O. do Nascimento.(04.09.2008)

"A mémória de Florbela Espanca"

Dorme, dorme, alma sonhadora,
Irmã gémea da minha!
Tua alma, assim como a minha,
Rasgando as núvens pairava
Por cima dos outros,
À procura de mundos novos,
Mais belos, mais perfeitos, mais felizes.

Criatura estranha, espírito irriquieto,
Cheio de ansiedade,
Assim como eu criavas mundos novos,
Lindos como os teus sonhos,
E vivias neles, vivias sonhando como eu.
Dorme, dorme, alma sonhadora,
Irmã gémea da minha!
Já que em vida não tinhas descanso,
Se existe a paz na sepultura:
A paz seja contigo!

(Poema de autor desconhecido encontrado no espólio de Fernando Pessoa)

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Poema Velho 2

Passei a procurar o teu olhar por toda a noite.
Procurei-o por entre luzes que iluminavam
os sorrisos no céu.
Encontrei amarguras ao invés da tua ternura.
E as fendas assim se abriram sob os pés
de quem bailava ao som do luar.
E vendavais inundaram aqueles olhares insípidos.
Procurei então pelo teu!
E tornei-me assim o eterno sonhador
que em noite encantadas
às crianças se aproxima.
E a contar belas lendas de amor,
procura o teu olhar perdido,
em algum sorriso infantil.

01/01/2008.

Poema Velho 1

Mergulhei nas dobras da minha memória
apostando ouvir no mar o som de tuas gargalhadas
abafadas pelo meu abandono.
E foi percorrendo as imagens turvas de minha mente
que encontrei a tua primeira imagem, com teu sorriso tímido,
e tua última aparição, com olhar enfurecido pelas mágoas dos anos.
Corri, então. Fugi das lembranças de outrora.
Lembranças de tardes ensolaradas
substituídas por noites escuras e gélidas.
E percebi que o amor pode ser sepultado.
E que os amantes guardam amortalhadas
lembranças de um amor que nunca foi
dentro do peito doente insandencido.

02/01/2008.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Confissões para a aurora...

O amor não deu, foi pouco para o nosso amanhecer.
Esperei a aurora, e a cada raio de sol matinal
te vi desaparecer aos poucos, como se sob efeito
de uma nebulosa que dissipa suas luzes em feixes coloridos.
E assim se esvai a nebulosa, e com ela
todo o desejo de permanência, de completude, de infinito.
Ah, se a aurora fosse feita apenas de crepúsculos.
Um crepúsculo após o outro para o nunca amanhecer.
Ah, se a claridade do dia, a mesma que dissipa o teu ser,
fosse apenas escuridão para o meu bem mais querer.
(Julho/2006)

FENDA

Nossos corpos exaustos de amar, inertes,
ansiando pelo último gozo, que não existe,
olham um para o outro, cúmplices,
emudecem no silêncio da manhã.
Bocas entreabertas,
Olhos que gritam desejos
Sorrisos que imploram
Outros sorrisos finitos,
Talvez vindouros
Em uma outra manhã qualquer.
(Dezembro de 2006)